segunda-feira, 28 de abril de 2008

Rir é o melhor remédio

Alunos dos Doutores da Alegria invadem a Zona Sul.




A Fábrica de Criatividade abre suas portas e dá as boas-vindas ao bom humor. É a Trupe Fuleragem composta por quatro integrantes que caracterizados de palhaços nos transportam para outros mundos com a peça Fora dos Trilhos.

O roteiro tem como foco o exercício da máscara de palhaço. Gastão, Aminésio, Kaçarola e Aurelino nos levam a construção de cenas clássicas de palhaços reproduzidos em livros especializados, porém utilizam com sutileza a experiência acumulada no cotidiano de cada ator.

O espetáculo teve início com o Programa de Formação para Jovens, dos Doutores da Alegia: “Fiquei sabendo do curso dos Doutores da Alegria e resolvi me candidatar à vaga. Para minha surpresa acabei sendo escolhido” afirma Washington Gabriel, 20 anos, ator.

O percurso até a formação completa de palhaço não é fácil. Foram 2 anos, de estudos, com treinamento de 4 horas diárias. Foi uma longa jornada de trabalho, incluindo desde a história do teatro, pedagogia das máscaras, experimentações e até a influência do gênero italiano de comédia.

O ator Leandro Mello, 20 anos, comenta: “Ser palhaço não é nada fácil. Com muito esforço e ralação passamos por diversas máscaras até chegar à máscara de palhaço, que por incrível que pareça foi a mais difícil, mas a que mais agradou a todos nós”.

Depois de muito esforço a peça ganha vida e os atores mudam de estadia: das salas de aula para os palcos. A experiência de estar atuando em diversos locais com diferentes públicos parece ter surtido resultado: “Ficávamos em uma sala trabalhando, mas nunca estávamos no palco. Essa experiência esta sendo muito boa” diz Luan de Jesus, 20 anos, ator.

Para lidar com o teatro, os atores da vida real encenam no dia a dia com diferentes profissões. Desde vendedor autônomo a educador ambiental: “Eu acredito que exista a possibilidade de viver de teatro, mas para isso o ator precisa de bastante experiência. Uma carreira a longo prazo” comenta Diego Alexandre, 20 anos,ator.

Depois de muito trabalho o público do Capão Redondo aprovou o resultado, e aplaudiu de pé a trupe que arrancou gargalhadas do público: “ Amei de paixão. Essa é uma linha que eu tento seguir no meu dia a dia, o bom humor” afirma Elienay de Jesus Rodrigues, 23, estudante de enfermagem.

O profissionalismo também ganhou destaque: “Eu achei muito interessante. São excelentes profissionais. Recomendo!” conta Rafael Guimarães Nobre, 21 anos, assistente de compras.

A Fábrica de Criatividade, apoiando a cultura nacional, levou ao Capão Redondo um pouco de alegria, que estava estampada nas faces do público em geral. Deu a oportunidade de pessoas de diversas idades, assistirem a arte de interpretar: “Eu nunca tinha ido ao teatro. Achei tudo muito divertido, gostei muito. Antes eu achava que o teatro era brega, agora já tenho uma outra visão” disse Fernando Aguiar Andrello, 24 anos, promotor de vendas.

A Trupe Fuleragem não para por aí. Todos vão encarar uma nova experiência e deixar de lado as máscaras de palhaços e vivenciar um drama. Agora é só esperar para conferir!


sexta-feira, 18 de abril de 2008

FÁBRICA DE CRIATIVIDADE E DOUTORES DA ALEGRIA !!!

O Capão Redondo não é só lugar de estatísticas criminais. Tem muita arte rolando por lá. Não acredita. Venha conferir !!!





quarta-feira, 16 de abril de 2008

Pelos Olhos de Anita





A esperança nos traços das crianças e seus olhares curiosos contrastam com as marcas de tempos difíceis no corpo dos adultos e idosos. A liberdade nas brincadeiras dos filhos em nada lembra a limitação do horizonte dos pais.

Anita está em um local de onde se pode avistar o futuro e o passado: a grande questão é o presente, quando se tem que trabalhar, mesmo sem emprego, para sobreviver, na subvida que tem na má formação, intelectual e corporal, sua principal aliada.

Anita Garibaldi é um assentamento do MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, com 113 hectares em Cumbica, periferia de Guarulhos na Grande São Paulo. Um quase-bairro com cerca de 5 mil famílias que tem apenas uma grande árvore, que não é revolucionário, que não é mais movimento social, que se tornou apenas reflexo da ausência de políticas públicas.

Observar como a comunidade se organiza para suprir as necessidades básicas que estão na Declaração Universal dos Direitos Humanos: alimentação, saúde, educação, moradia, trabalho e lazer é uma barreira a ser rompida com muito calor, terra vermelha e seca, com o vento forte que hora ou outra aparece para amenizar a temperatura. Vento forte que forma pequenos tornados no campo de futebol.

Conhecido como Índio, Alcir da Silva, 27 anos, é proprietário de uma quitanda de legumes e frutas. É dessa pequena loja que tira o sustento de toda a sua família: “Minha filha. Pior coisa que tem é você acordar de manhã e seu filho pedir um pão e você não tiver. Passa muita coisa ruim na cabeça do cara”.

Incrivelmente é feliz. Já passou por situações piores. Não reclama do calor, nem desanima diante das dificuldades. Segundo ele, a ocupação do terreno lhe deu a oportunidade de ter um lar, um lugar para descansar coberto de pó diante de um dia e uma noite de intenso trabalho: “A pior coisa que tem é você trabalhar o dia todinho e não ter onde descansar o corpo. Hoje não, hoje eu tenho. Não é aquele pedação, mas eu tenho. Antigamente eu dormia debaixo de uma balança, ali na Cumbica, ali numa firma. Passei dois anos debaixo dessa balança. Por isso que eu falo que hoje eu tô no paraíso. Eu sou um cara que estou desempregado, certo. Tô vivendo disso aqui. Dessa quitandinha. No sábado eu saio pra vender framula. Não sei se vocês conhecem o que é framula. Aquelas frases de amor que vende no bar.”

Nessa mesma rua surge uma fila inesperada muito aguardada por seus moradores. Trata-se da entrega semanal de alimentos. Mas o que chama a atenção é um senhor que observa o movimento, como se estivesse incumbido dessa missão. Parece estar atento a todos os detalhes e sua presença impõe respeito aos moradores.
É o senhor Feliciano Pereira de Almeida, 60 anos, morador e membro da Associação dos Moradores do Jardim Anita Garibaldi: “Aqui mesmo nós temos na Igreja Católica, aqui todo dia de sexta-feira, eles adoa alimento ai, mandioca, folha, tomate, tudo eles dão pro pessoal. Quando não tem, algumas pessoas daqui sai pra ir pegar fora”.

Seu Feliciano acompanha a incessante busca por conhecer um bairro tão carente e desprovido de apoio do governo. Tem um motivo pessoal, é um dos líderes do Movimento Sem Teto que naquele local havia se dissolvido. Conhece todos do bairro, esteve desde o primeiro dia na ocupação. Participou do loteamento, medindo lote por lote, distribuindo um pouco de esperança a todos que acompanharam ou apoiaram o movimento.

Seu Feliciano continua nos guiando entre as ruas do Jardim Anita. Entre uma casa e outra ele vai falando de sua luta e de seus sonhos. Sonha com a posse da terra, quer ser legalizado. No Anita sua missão ainda não terminou, mas ele vai procurando outros lugares para uma futura ocupação. Faz os serviços de base e não gosta de criar raízes: “A luta não pode parar, tem muitas pessoas sem teto ainda”.

Como um dos seus principais companheiros, ele nos apresenta o Seu Arruda,59 anos, conhecido como Papai Noel. Os olhos azuis, a barba e os cabelos bem brancos nos fazem lembrar o “bom velhinho” ou talvez Karl Marx. Logo de cara ele mostra sua tendência política. Veste uma camiseta com a seguinte mensagem “Desemprego FHC é campeão”.

Conta que já fez de tudo um pouco. Após a ocupação era responsável pela segurança do local e das pessoas. A paz da comunidade dependia dele. Já se envolveu em todo o tipo de briga, até mesmo briga de casal. Depois, coordenou o caminhão de água. Tinha a função de dividir a água de forma igualitária: “O pessoal brigava pela água, porque era pouca né. Vinha um caminhão de água para abastecer doze mil pessoas. Então eu tinha que separar a água, um pouquinho pra cada um. Tinha uns que queriam mais do que os outros e era uma briga danada!”.

Mesmo com uma equipe responsável pela distribuição da água, as brigas não terminavam. Então formaram uma nova equipe desta vez para assegurar os funcionários do Serviço Autônomo de Abastecimento e Esgoto de Guarulhos (SAAE): ”Algumas vezes eles não queriam nem vim aqui. Eles estavam com medo. A gente ia lá no SAEE e eles falavam: Toma a chave do meu caminhão. Pode ir. Eu não quero, eu não vou. Então nos montamos um esquema que a gente ia lá buscar, a gente ia acompanhar eles lá, carregar o caminhão de água, trazer, chegar aqui, distribuir. Garantir a segurança deles”.

Depois a comunidade foi se acostumando a distribuição e a função de segurança ficou extinta. Seu Arruda chama muito a atenção. Ainda mora no mesmo barraco de lona dos tempos da ocupação e tem como companheiro apenas um cachorro.

A caminhada parece nunca chegar ao fim. Muito sol, só mesmo um geladinho de tamarindo comprado ali mesmo pra aliviar o calor. Seu Feliciano insiste para que conheça um morador. Elvis Vieira, 25 anos, mora em um barraco de madeira coberto de quadros e bandeiras do Movimento. É muito jovem, comparado aos outros líderes.

Elvis logo quer explicar a história do bairro. “Bom, essa aqui é a minha casa. Eu moro aqui desde 2001. Aí tem a questão do pessoal que consegue fazer a sua casa e tem a questão do pessoal que não consegue. Eu sou um desses também, que até hoje ainda moro no barraco de madeira. Por motivo de falta de emprego e por motivo também dessa sociedade nossa aí injusta né? Que não tem igualdade social pra todos. É um país que 10% manda e 90% é mandado. Uma casa pra mim, estar vivendo com a minha esposa, futuramente filhos, quatro cômodos e um banheiro pra mim seria ótimo. Tava melhor. Não precisaria ser uma casa que nem tem gente que fez aqui, sobrado. Eu acho que todo ser humano, todo cidadão que mora no Brasil, deveria ter sua casa. Com quatro cômodos e um banheiro bem feito.

Elvis faz questão de deixar uma mensagem para todos que um dia sonharam em melhorar de vida, buscar um ideal: “Eu queria dizer que um sonho que se sonha só é somente um sonho que se sonha só. Mas um sonho que sonhamos juntos é realidade”.